Quando
chegou à conclusão de que a vida neste mundo era impossível, começou a
construir a máquina de sua partida. Durante anos negligenciou a vida em
sociedade, empenhando-se unicamente em ciscar pelos ferros-velhos atrás de uma
porca ou parafuso que servisse à sua fabulosa construção. Passava as noites
trancado em sua oficina, rabiscando rascunhos sem fim e confessando suas
frustrações à inocência dos papéis em branco. Planejou um mecanismo absurdo que
haveria de libertá-lo definitivamente de sua existência terrena, e a este deu o
nome de Barão. Projetou-o gigante, infalível. Tinha cordas de harpa, pernas de
aço, e fortes asas de anjo. E quando ficou completo era uma obra-prima em todos
os seus detalhes: dos mais letais aos mais sutis.
Mas quando
chegou a hora de ligá-lo, acovardou-se. Foi tomado por um súbito medo do
desconhecido. Viu-se refletido na carne de lata do Barão. Sua força, sua
ferocidade. Percebeu também nos dois uma incorrigível fragilidade à solidão e
ao tempo. Naquele instante soube que criou um amigo, ao invés de um instrumento
para sua fuga definitiva.
Então fechou os olhos, e apertou o
derradeiro botão. Dois instantes depois, não havia mais nada em seu escritório.
Os móveis haviam sido destruídos pelo fogo, e o teto estava ferido por um
gigantesco buraco. Entre os destroços não se podia reconhecer nada deste mundo,
com a exceção de um bilhete chamuscado e de algo que poderia ser um esqueleto
metálico completamente carbonizado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário